2015-03-04 16:00:03 (UTC+02:00) Harare, Pretoria
CSCS, Cistac e banalização do mal
Num momento em que acaba de acontecer uma mudança na liderança do nosso Conselho Superior de Comunicação Social, e numa semana em que foi assassinado o constitucionalista e docente catedrático Gilles Cistac, apraz-nos fazer uma reflexão sobre como vai a alguma imprensa moçambicana nos tempos que correm.
Vamos tomar como ponto de partida a forma como foi coberta jornalisticamente por alguns órgãos de comunicação social moçambicanos o assassinato de Cistac. Algumas televisões, por exemplo, sem observar nenhuns principio de ética, decidiram fazer do assunto um espetáculo em busca incessante de audiências.
Noutras partes do mundo, neste tipo de casos, em respeito às vítimas e suas famílias e ao próprio público geral, evita-se sempre que possível exibir sangue.
No local do crime, vimos, através de algumas das nossas TV’s pessoas (entre homens, mulheres e crianças) usando os seus telemóveis e tabletes a tirarem fotografias e a filmarem. Tais imagens depois foram passadas a algumas dessa tv’s e transmitidas e feito capa na imprensa escrita.
Foi chocante ver tais imagens sobretudo, quando sabíamos que foram feitas enquanto Cistac ainda estava vivo e a perder muito sangue. Aliás, o director do Hospital Central de Maputo, João Fumane, disse que o malogrado depois de baleado perdeu muito sangue antes de dar entrada no HCM, e esta pode ter sido aparentemente uma das causas da sua morte.
A forma extremamente chocante, fria e indiferente como foi presenciado pela multidão de mirones o corpo inerte, mas vivo do professor Cistac só pode ser compreendida pela banalização do mal.
Esse processo de tornar o mal uma banalidade como qualquer outra, despojado de seu carácter atemorizante e portentoso, ocorre pela frequência da sua prática e pela impunidade dos seus praticantes.
Praticado em larga escala, nas suas mais variadas formas, presente na vida quotidiana como coisa corriqueira, o mal acaba se tornando coisa habitual e ninguém concede a ele a devida atenção e preocupação.
No dia seguinte ao do assassinato de Cistac, vimos um semanário a acusar o partido no poder, a Frelimo de ser assassina, ou seja este jornal supostamente liga o partido no poder ao crime, acusando-o de autoria, ou co-autoria, moral ou material. Outra imprensa não diz exactamente isto, mas insinua nesse sentido.
No HCM, enquanto Cistac estava sob cuidados intensivos, vimos uma romaria de indivíduos que sob a capa da academia, sociedade civil, partidos políticos, foram buscar protagonismo, querendo aparecer à custa do sofrimento a que estava sujeito quele docente, num período que afinal se revelaria como as últimas horas da sua vida.
Num momento em que se aconselharia serenidade, já havia “políticos” prontos para apontar dedos de acusação, antecipando-se às investigações a cargo das autoridades competentes.
Em nossa modesta opinião, alguma imprensa tem uma quota-parte de culpa ao veicular declarações tão desastrosas como as que ouvimos, e como tal deviam ser responsabilizada. Não basta acusar, é necessário provar.
Mas, porque é que parte da imprensa moçambicana continua a comporta-se desta maneira? Nós pensamos que é por falta de impunidade.
Acusar, por exemplo, um antigo chefe de Estado de “vende-pátria” no mínimo sem provar com factos, é crime punível à luz da nossa lei de imprensa, e em última análise à luz da nossa Constituição da República.
Há uma lei que protege os antigos chefes de Estado em Moçambique, como há em várias partes do mundo, porque não são figuras quaisquer. Merecem dignidade e respeito, mesmo já fora do poder formal.
Pode-se se dizer que alguns órgãos de comunicação social e respectivos profissionais agem fora da lei e da ética por falta de formação profissional adequada, mas esta não pode nem deve ser desculpa.
O CSCS, que é nalgum momento é acusada de estar moribunda tem que começar a agir, fazendo cumprir a lei de imprensa e a Constituição da República, sob pena de ser vista como contribuindo para o descrédito para a qual está a caminhar o sector em Moçambique.
Outrossim urge nos perguntar sobre se não é altura de operar reformas nas atribuições desde CSCS, que aparentemente está desprovido de poderes necessários para impor ordem e disciplina neste crucial sector que tem uma missão importante de contribuir para uma sociedade sã e um Estado de Direito democrático.
|
|